Quem visita o Parque Ecoturístico Municipal São Luís de Tolosa em Rio Negro-PR se encanta com a belíssima pintura da Capela Cônego José Ernser, que fica anexo ao parque, no prédio do antigo seminário.
O estilo da capela é eclético, sendo que o céu lateral é gótico e as abóbadas são em estilo românico. A capela foi revestida pela técnica do estuque. A pintura na capela do então Seminário e Collegio Seraphico teve início no ano de 1932. O formidável trabalho durou até 1935. A técnica de pintura utilizada no forro é óleo sobre tela. Nas laterais e rodapés vê-se a utilização de têmpera mural.
Em função da ação do tempo e, consequentemente, a proliferação de microrganismos, a capela do Seminário passou por um processo de restauração. A sua reinauguração ocorreu em 15 de novembro de 2000 com a presença de Dom Paulo Evaristo Arns, que foi aluno no antigo Seminário de Rio Negro. Neste dia foi denominada a “Capela Cônego José Ernser”, em homenagem ao conhecido Padre Ernser, ex-vigário de Rio Negro chamado carinhosamente de “construtor de igrejas”.
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O que poucas pessoas conhecem é o nome do autor da belíssima pintura da capela. O nome do grande artista é Pedro Cechet. Há poucas informações disponíveis sobre ele, mas eu pesquisei e consegui algumas para valorizar este grande profissional.
Pedro Cechet também fez a pintura do Cine Teatro “Antonio Cândido do Amaral”, que também fica anexo ao antigo prédio do Seminário de Rio Negro.
Curiosidade: a pronúncia do sobrenome é Chequéti ou Chequêti dependendo do sotaque.
GRATIDÃO
Para esta pesquisa eu tive a grande colaboração da querida Mávia de Aquino Santos (sobrenome de casada; de nascimento é Cecchet), que é filha de Geraldino Cecchet, que atualmente tem 96 anos de idade e possui uma memória incrível.
Geraldino é sobrinho de Pedro Cechet e colaborou muito com relatos históricos. Quando Mávia adquiriu a cidadania italiana passou a usar o sobrenome correto, que é Cecchet com três letras cês. Outros familiares também alteraram o Cechet para Cecchet.
Mávia também está pesquisando sobre Pedro Cechet e tem seu pai como a grande fonte de informação, então eu fiquei bastante feliz por conseguir obter o contato dela. E mais feliz ainda por ela ser uma pessoa que tem a vontade de preservar e valorizar a história. Fica aqui registrado o meu grande agradecimento.
Agradeço também ao senhor Ivo Ferrari da Associação de Escritores do Alto Vale do Itajaí e ao jornalista Jonas Felácio Júnior. Ambos prontamente me atenderam quando eu procurava por familiares de Pedro Cechet. Muito obrigado!
NASCIMENTO E FALECIMENTO
Pedro Cechet nasceu no dia 1 de setembro de 1894 na localidade de Guaricanas, no município de Ascurra, que foi desmembrado de Indaial-SC em 1963. (Até 1896 a região de Ascurra ainda pertencia à Blumenau).
Faleceu em 21 de setembro de 1962 com 68 anos de idade. Na Certidão de Óbito a causa da morte consta como “Insulto cerebral”, porém os familiares não sabem ao certo a real causa. Seus últimos anos de vida foram passados perto da família em Rio do Sul-SC, onde está sepultado no Cemitério Municipal.
FAMÍLIA
O talentoso pintor foi o oitavo filho dos imigrantes italianos Giacomo Antonio Cecchet e Maria Maddalena Conte. Teve os irmãos e irmãs: Angelo, Amábile, Antonio, Emilia, Giovanni, José, Luigi, Maria, Philomena e Thereza. Todos nasceram em Guaricanas, local onde seus pais fixaram residência quando chegaram ao estado de Santa Catarina. Pedro não teve cônjuges e filhos.
Geraldino lembra que durante muitos anos Pedro Cechet viveu na casa de uma sobrinha. Lá dormia e mantinha seus poucos pertences. Era lá também que guardava seu caderno de anotações. Neste “diário” Pedro registrava detalhes e a localização de todas as igrejas que ele pintava.
Seus últimos anos de vida foram difíceis. Já muito doente, por longos meses Pedro se tratou no quarto que ocupava na casa da sobrinha. Geraldino lembra que visitou o tio por diversas vezes, mas nunca o questionou sobre a sua doença, por isso desconhece a real causa da morte.
ESTUDOS
Mávia de Aquino – que em breve lançará um livro com informações sobre o seu tio-avô – apurou em suas pesquisas que Pedro Cechet viveu em Guaricanas durante toda a infância e adolescência. Depois completou a primeira fase dos estudos no Seminário Seráfico de Rio Negro-PR. Ao que tudo indica, de acordo com Mávia, a formação artística falou mais alto do que a religiosa. Pedro se manteve solteiro e sem filhos até o final da vida.
Pedro era o artista da família e estudou pintura no Rio de Janeiro e arte sacra na Itália. Seus estudos na Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro, teriam sido pagos pelos padres franciscanos. Como já mencionado, em 1935 Pedro concluiu as pinturas da capela do Seminário de Rio Negro (atual Capela Cônego José Ernser). Há a hipótese de que a referida obra teria sido realizada por Pedro Cechet como uma forma de gratidão aos franciscanos que lhe deram a condição de aprender o ofício que tanto amava.
Com relação aos estudos na Europa não há um consenso em relação ao local exato onde teriam sido realizados. Embora alguns familiares afirmem que tenham sido em Roma, o artista especializou-se em pintura sacra, possivelmente em Florença.
ESTILOS DAS OBRAS ARTÍSTICAS
Mávia em suas pesquisas cita que os trabalhos de Pedro Cechet reproduzem a delicadeza e a suavidade das técnicas de perspectivas e iluminação somadas à preocupação com a composição e o espaço, características estas típicas de Fra Angelico (1395-1455), pintor florentino, religioso italiano, do fim do período gótico e início das concepções renascentistas. Por esta razão tudo indica que os estudam tenham sido realizados em Florença e não em Roma.
Ainda de acordo com Mávia, as obras de Pedro Cechet revelam sólidos conhecimentos de iconografia (forma de linguagem visual que usa imagens para representar algum tema) religiosa católica. O artista adotava a perspectiva linear e aérea típicas do Quattrocento (eventos culturais e artísticos do século XV na Itália), enquanto a narração figurativa preserva valores do gótico internacional. As composições piramidais que predominam nos personagens centrais, o equilíbrio de formas e massas cromáticas remetem ao segundo período do renascimento. Nas composições e nas cores das obras de Pedro, há certo sentido metafórico típico do simbolismo.
PINTURAS REALIZADAS
Pedro Cechet realizou pinturas sacras em inúmeras igrejas e capelas. Suas obras – que sempre foram ricas em detalhes, como podemos perceber na Capela Cônego José Ernser – podem ser encontradas em diversas cidades, como Rio Negro-PR, Ascurra, Içara, Urussanga, Itajaí, Criciúma, Rio do Sul e Nova Veneza.
Sua técnica é conhecida e apreciada por diversos restauradores. No projeto Mestres Artífices Santa Catarina – Cadernos de Memória há uma curiosidade sobre a personalidade de Pedro Cechet citada por um restaurador de igrejas: “Pedro Cechet era complicado, não pintava com barulho, nem com pessoas estranhas na sala”. Isso é algo compreensível, penso eu. Afinal, é uma profissão que requer muita atenção aos detalhes e qualquer barulho ou pessoas por perto (chatas ou não) atrapalha muito.
Em 1955 Pedro Cechet fez a composição artística na Igreja da Misericórdia, em Içara-SC. Em 2019 a igreja foi restaurada. “Eu já restaurei três igrejas do Pedro Cechet. Ele era um gênio da composição. Você chega dentro das igrejas dele e tem um mundo de cores, mas é muito harmonioso”, comentou a restauradora responsável pelo trabalho para um jornal da cidade.
Em 1960 Pedro Cechet fez a pintura na Capela São Bom Jesus, também em Içara.
Em Ascurra-SC, onde Pedro Cechet nasceu, há a Igreja Matriz Santo Ambrósio que foi inaugurada em 1912 depois de conflitos entre os padres salesianos e franciscanos. Sua construção iniciou em 1902 e sua arquitetura é preservada desde então. A parte frontal e da torre foram feitas nas décadas de 30 e 40. A pintura interna foi feita por Pedro Cechet.
Pedro Cechet também realizou outros trabalhos que não estavam relacionados diretamente à pintura sacra. Ele realizou trabalhos de pintura em casas de familiares e pessoas próximas.
AJUDANTE
Alguns relatos mostram que Pedro Cechet tinha ajudante e gostava de estimular a criatividade das pessoas. Há um relato legal da história do artista plástico Joventino Rizzieri da cidade de Içara. Para um jornal da cidade ele contou que a paixão por quadros e pela pintura surgiu ainda na juventude, aos 25 anos de idade. Na época, Pedro Cechet esteve na região para fazer algumas pinturas na igreja ao lado da casa onde morava, e convidou-o para ajudar nos trabalhos. A partir disso, Rizzieri descobriu que tinha talento para a arte.
“O Pedro Cechet almoçava e pernoitava aqui em casa. Um dia ele perguntou se eu sabia como se desenhava uma pessoa. Eu não tinha nenhuma noção, mas ele me deu uma régua e um lápis com um pedaço de cartolina e explicou como deveria começar. Após fazer o desenho, observei que ele estava dando risadas, perguntei o motivo e em tom de brincadeira ele falou que o ajudante que trabalhava por cerca de cinco anos não fazia o que eu fiz”, disse o artista.
De fato o grande pintor teve um ajudante. Geraldino Cecchet lembra que seu tio Pedro Cechet, antes de iniciar a magnífica obra na Catedral de São João Batista, na cidade de Rio do Sul-SC, pintou a igreja de Nossa Senhora da Imaculada Conceição, na Valada Itoupava, também em Rio do Sul. Foi nesse período que Henrique Sborz deu início ao seu trabalho de ajudante do pintor.
“ZIO PIERRO”
Pedro era carinhosamente chamado de “zio Pierro” pelos familiares. Era um homem calmo, educado e extremamente reservado que só falava o essencial. Geraldino lembra que Pedro não gostava que conversassem em português. Com as pessoas mais próximas ele só falava em italiano. Seu olhar era de reprovação quando alguém falava em português com os filhos pequenos. Ele dizia que deveriam ensinar-lhes o italiano, já que o idioma português eles aprenderiam na escola.
“Sempre ouvia falar de um tal de zio Pierro, porém só o vi pela primeira vez quando tinha uns 10 anos. Ele já havia retornado da Europa e estava visitando os parentes em Rio do Sul. Era domingo. Eu e meu pai Angelo, como de costume, estávamos indo à missa no centro da cidade. No meio do caminho, nos deparamos com ele. Era próximo à casa de tia Marieta Ledra, irmã de tio Pedro e esposa de Luiz Ledra. Penso que ele havia pernoitado lá. Lembro de meu pai dizendo: Olhe Geraldo, o zio Pierro chegou! Ele disse que estava exatamente indo nos visitar. Então, retornamos com ele para nossa casa. Fiquei observando meu tio o tempo todo. Afinal, não era todo dia que se recebia a visita de um parente tão importante e que havia morado na Europa”, lembra Geraldino.
HOMENAGENS
Eu pesquisei bastante e não consegui encontrar muitas homenagens ao grande pintor Pedro Cechet, o que seria justo, pois um talento assim é raríssimo até mesmo nos dias atuais. No início do século XX ainda não havia tantos recursos como há hoje, então fazer o que Pedro fez em diversas igrejas e capelas é algo extraordinário e merecedor de valorização no contexto de patrimônio histórico-cultural.
Na cidade de Içara-SC realizaram uma homenagem bacana para o talentoso pintor. Lá foi mantido por um bom tempo o Salão de Artes Pedro Cechet, que é uma exposição que tem por objetivo estimular, documentar, interagir, revelar novos talentos e disseminar as mais diversificadas manifestações plásticas.
Para Rio Negro e demais cidades onde há obras deste grande artista eu deixo a sugestão: criar também uma exposição de arte com o nome Pedro Cechet, ou então um concurso anual para que pintores e demais artistas divulguem seus trabalhos. Seria uma justa homenagem ao pintor que continua encantando a todos. Além disso, é importante deixar bem visível um quadro com a foto, nome e informações sobre Pedro Cechet para que todos os visitantes saibam quem foi o grande responsável pelas belíssimas pinturas.
Na localidade de Rio do Meio no municipio de Morro Grande tem uma igreja pintada por ele . Linda
Descobri que em Praia Grande – SC e Jacinto Machado – SC possuiu igrejas que foram pintadas por ele, uma igreja fica localizada na comunidade de Tenente e a outra na comunidade de Timbopéba ambas belíssimas e ricas em detalhes.
Autor das pinturas da Matriz Cristo Rei de Trombudo Central, anos 1958/1959
Igreja matria Cristo Rei de Trombudo Central foi pintada por Pedro Cechet, anos 1958/1959.
Favor mencionar.
Lembrem da Igreja Matriz de Trombudo Central que tambén foi pintada por Pedro Ccchet.
Igreja Cristo Rei, da paróquia de Trombudo Central, foi pintada por Pedro Cecchet, nos anos 1958/1959. Belíssima pintura realizada quase no fim de sua vida, 03 anos antes de sua morte. Gostaria que também constasse do acervo publicado entre as igrejas pintadas por ele . Tive oportunidadre nesta período de conhecer Pedro Cecchet.
nome Ignez Bertoldi Cabrera Trigo.
Muito interessante a história linda pintura que deve ser valorizada parabéns pelo trabalho foi muito bacana mesmo sua publicação e muito fascinante a pintura da igreja quem entra lá fica impressionado com o talento do pintor.
Outra curiosidade…
Quando trabalhei no Colégio São Paulo, em Ascurra, nos idos de 1986 e 1987, encontrei a caixa os moldes dos principais desenhos que o artista usava para traçar as letras e outras figuras. Eram lindos, perfeitos…
Mostrei tal caixa com os moldes ao saudoso P. Sílvio Mondini. Foi neste momento que ele disse-me que eram os moldes usados pelo Pedro Cecchet. Não faço ideia dos motivos pelos quais ele teria deixado lá. Ficaram anos e anos nos sótãos do Colégio, completamente intactos. Hoje, não se ainda existem… Nem fazia ideia da importância histórica que teriam neste momento.
Há um equívoco no texto publicado. A autoria diz: “Em Ascurra-SC, onde Pedro Cechet nasceu, há a Igreja Matriz Santo Ambrósio que foi inaugurada em 1912 depois de conflitos entre os padres salesianos e franciscanos…”.
Não se tratava de conflitos entre os padres, mas, entre os católicos italianos que não querias ser atendidos por sacerdotes alemães. Neste sentido é que foi solicitada a vinda dos Padres Salesianos de Dom Bosco, italianos, para atender pastoralmente Ascurra, rio dos Cedros, Rio do Sul etc. Tão somente uma pequena correção de interpretação.
Sou bisneta de Philomena irma de Pedro.. minha vó hoje com 90 anos ainda conta histórias sobre ele e sempre fico encantada com suas histórias, era um bom homem
Magnifica historia.
Gratificante valorizar grandes obras de artistas nem sempre lembrados. Obras
maravilhosas nem sempre identificadas, a não ser se pesquisadas. Nosso país comete algumas falhas nesse sentido. Mas quando se trata de um ente querido é motivo de orgulho divulgar suas lindas obras, prestar homenagens e tudo que preserve sua memória pra sempre.
Como eu gosto de ler relatos, histórias reais de vida de pessoas que tiveram uma contribuição importante para a nossa sociedade.
Parabéns por essa matéria Everton!
Parabéns ao idealizador da pesquisa….realmente são lindas as pinturas sou testemunha, esse artista merece reconhecimento.
Parabéns Everton, belíssimo relato! Com certeza Pedro Cechet merece ser lembrado e seu trabalho valorizado. Em nome da família agradeço seu interesse e empenho na divulgação da vida e da obra do grande pintor fé artes sacras que meu tio-avô foi. Muito obrigada!
esperando ansioso pelo livro que vai falar acerca da vida e obra de Pedro… só esta publicação aqui já me deixou encantado.
Bela história. Porém, quando a dona Mávia concluir a sua pesquisa, espero a sua publicação por aqui.